quarta-feira, 22 de julho de 2015

Quando eu não existia.






Lembro das vezes que fazia caretas de negação, o espelho refletia
uma imagem que não estava na televisão, nas capas de revistas e muito
menos nas bonecas da minha coleção. Meu Deus! Porque tão escura,
porque tanta rejeição.

O pente esticava, doía, que dias tristes o de fazer penteado de Maria,
minha tia dizia que cabelo ruim não dava cria. Já não tinha paciência,
minha mãe atendeu as preces da minha tia.
De cabelo liso eu sorria, agora eu tava mais próxima da moça da tv,
da boneca e sem tristeza, era decretado o fim dos penteados de Maria.

Mas eu ainda não gostava do via, nariz grande, pele escura, o cabelo
liso não esconde a etnia. 
Piercing no nariz e batom de cores vibrantes não servem para pele escura
era o que a Capricho me dizia. 

Me via na pele branca, me negava porque não sabia que EU existia
o cabelo liso me deixava com o rosto grande, não gostava, fingia. 
Truques pra afinar o nariz, usar pó da cor de giz, que loucura, a rejeição
as vezes custa caro, fere e deixa em agonia.

Salão era tortura, o creme ardia, feria, eram horas de prisão disfarçada de
alegria. "Pra ficar bonita tem que sofrer", eu ouvia. Bonita pra quem? Sofrer
pra quê? No espelho eu  não me reconhecia, a minha franja nunca ficou igual a 
da moça branca, era o que eu mais queria. 

No dia que vi meu cabelo alisado no chão, amontoado e no meu couro os cachinhos
formados, nasci. Descobri que dentro de mim outra pessoa vivia. 
Eu, negra, crespa, refletida no espelho, que dia!
A capricho negava, a tv escondia, a industria não refletia, mas eu EXISTIA.




domingo, 19 de julho de 2015

Macho

Macho diz que moçx bem resolvida é vadia,
mas pro agrado dele tem serventia.
Macho diz que moçx com vida sexual ativa é puta, não tem solução, não serve pra usar aquele vestido branco e receber unção.
Macho diz que moçx tem que se da ao respeito pra exercer o seu direito.
Macho não tem empatia, vive contando vantagem e espalhando misoginia.
Ah! Macho, vai cuidar da sua mente doentia.


sexta-feira, 17 de julho de 2015

Descobrindo o feminismo e a importância do feminismo negro!

Quando tinha mais ou menos 13 pra 14 anos eu ouvia repetidas vezes de uma tia que quando me casasse meu marido iria me bater pelo fato de eu ser preguiçosa e não saber cozinhar, até então aquilo pra mim não soava tão absurdo como soa hoje. Inúmeras vezes eu ouvi essa mesma tia contar como ela teve um casamento horrível, que o marido batia nela e das vezes na qual ela pegou ele com outra na cama. E sabe quem eu julgava, sim, eu julgava ela. Pensava em como ela não tinha se esforçado em ser uma boa esposa, se ela era muito preguiçosa e por isso ele fez aquilo com ela e tantas outra besteira machistas que a gente vê e lê todos os dias.
Ficava imaginando quão horrível é casar, ter que cuidar de casa, marido, filho, trabalhar... tinha um sonho de ser mãe solteira pra não ter que passar todos os absurdos que ouvia nas rodinhas de conversas entre minhas tias.
Fui crescendo e o universo masculino se tornou algo real pra mim, eu não pensava mais nas historias traumatizantes da minha tia. 
Ia ao shopping com as amigas, paquerinha na escola, paquerinhas pelo bairro, etc. Mas tinha uma coisa que me incomodava nas saídas com minhas amigas, comecei a perceber que eu não chamava muito a atenção dos garotos, enquanto elas faziam "sucesso", sempre me perguntei se não era pelo fato de ser negra, apesar de estar toda inserida no padrão eurocêntrico, mas de imediato eu descartava essa ideia, afinal se fosse isso mesmo eles nem seriam meus amigos, eu pensava. Eu tinha preferencias por garotos brancos, cresci com a ideia de casar com um homem não negro pra que meu filho não nascesse negro, isso é real, eu pensava assim e as vezes me assusto com isso quando lembro. E claro os meninos por qual me interessava nem olhavam pra mim. Comecei a me colocar defeitos, achava que era por causa das roupas ou cabelo que não estava legal, minhas amigas tinham aquelas belas progressivas, piercing no nariz (que eu sempre quis usar, mas não me permitia porque sentia vergonha do meu nariz, achava que ele me inferiorizava e alem do mais diziam que  não ia ficar legal porque meu nariz era muito grande), piercing no umbigo (que acabei colocando pra me enquadrar no grupo, depois descobri o quanto odiava aquele negocio), odiava o meu cabelo, tentava ao máximo deixa-lo liso. Comecei a não querer mais sair com elas, me sentia inferior e deslocada, mas como não tinha muita escolha eu saia e lá estava eu no meio de muitas pessoas, mas ao mesmo tempo só. 
Quando completei 16 anos e já estava no ensino médio as coisas começaram a mudar e eu me sentia mais confiante. 
Mas só aos 20 anos quando comecei meu processo de empoderamento, percebi que aquela minha ideia descartada (de não chamar a atenção dos garotos por ser negra) não era bobagem e não era mentira.
A solidão da mulher negra é real, é concreta, é sentida e é apenas mais uma das opressões sofridas por  nós, dentre tantas outras não menos importante. O feminismo negro deve ser abordado, esclarecido e direcionado. Ele não divide o feminismo, muito menos segrega, quem pensa isso é quem já tem essa segregação em mente. A mulher branca nunca vai poder falar pela mulher negra. Se é difícil até pra nós que sentimos na pele, saber identificar pequenas opressões diárias, imagina quem nunca sofreu. Se o feminismo vem pra nos empoderar diante da opressão machista o feminismo negro vem pra lutar pela opressão machista, racista, de inferiorização da mulher negra, da solidão e da falta de representação para tantas que assim como eu que um dia anulou e para muitas que ainda anula o fato da sua solidão ter relação com a cor. 

segunda-feira, 28 de abril de 2014

#NÃOSOUMACACO

Eu acho que você não entendeu, tá um pouco equivocado.
Não me chama de macaco.
Cala boca, branco, fascista.
Acha que me engana com essa banana e esse racismo velado, massacrado e apoiado.                  

Sua fama te levanta é seu sustento, mas antes se enquadrava moreno. Hipócrita! Acha que ta mudando o mundo, mas não passa de uma campanha sem fundos.              
Acha que me engana, mas minha RAÇA É HUMANA!

                                                                                                                                                                                                                                                               

domingo, 20 de abril de 2014

Sim Tia, eu quero ARMAR!

Não Tia nem todos os cabelos crespo/cacheados não são iguais a da Sheron Menezes!
Não Tia, não é regra, lei ou mandato que cabelo bonito, é cabelo que tem balanço, malemolência, caimento!
Não Tia, eu não quero abrir meus cachos!
Não Tia, "meu cabelo" não aparece na TV porque ele não é "referencia" !
Não Tia, eu cuido da minha "bucha" passo shampoo e creme!
E enfim chegamos ao ponto no qual concordamos.
Sim Tia, eu quero anda com meu "cabelo duro", ser "nega maluca", ser "referencia de gente PRETA"!
Sim Tia, quero andar com ele pra cima, "bombril", "esponja", quero ter "colmeia de abelha", "casa de maribundo"! Quero ser mundo, quero ser essência, quero ser vista, quero ser falada, quero ser NEGRA e onde for quero levar isso comigo.
Sim Tia, eu quero ARMAR!

Cíntia Oliveira.